Por: Beatriz Meneses 22/01/2019
E se pensássemos a arte como expressão de nossa existência e não somente como produção de uma obra material?
Olhando atentamente à nossa volta, podemos perceber os automóveis passando rapidamente, o som de pássaros e de construções, o cheiro de natureza e poluição que impregnam o ar, o tempo e as estações que estão em constante mudança. Em casa vamos fazendo alterações para agradar a nossa concepção de uma realidade “ideal”. Tudo se move e se transforma.
Exprimimo-nos criativamente todos os dias no modo como nos vestimos, no nosso estilo de vida, na maneira como falamos, no que cozinhamos e em quase todas as decisões que tomamos. Na realidade, não é possível evitar ser criativo. Com o universo num constante fluxo, estamos todos num contínuo estado de transformação. Ao entrarmos em contato com esse dinamismo e com as emoções provenientes do mesmo, estamos criando, gerando movimento e novidades a cada instante.
A criatividade, vista como uma forma de comunicação, pode proporcionar entendimento e aponta uma interação entre os mundos internos e externos do sujeito. Pensar a criatividade é entender que é possível se reinventar e estabelecer diferentes concepções que são constantemente mutáveis. Este processo não é planejado: simplesmente acontece, assim como a vida.
A relação entre psicologia e arte decorre, naturalmente, de um certo modo de existência ou de um determinado modo de faze-la e experimenta-la no instante vivido. A afirmação plena da vivência, as emoções provenientes da situação representada e o caráter experimental e potencialmente renovador, configuram possibilidades de existência como arte, como criação e como produção de vida. A criatividade, por si só, já carrega uma característica terapêutica na medida em que proporciona modos de comportamento inusitados e reinventa formas de estar no mundo a cada momento, evitando que haja cristalização nos padrões de resposta do indivíduo frente as situações cotidianas.
Para a Gestalt, a capacidade do indivíduo ser criativo e espontâneo é proporcional à sua saúde mental, demonstrando fluidez e capacidade de adaptação. Em Gestalt-terapia, ajudamos o indivíduo a perceber como ele interrompe seu fluxo autorregulatório e criativo, auxiliamos nosso cliente a buscar modos criativos de agir a cada nova situação vivida, permitindo que ele “ensaie”, na relação com o terapeuta, modos criativos de responder às demandas da vida. Para que isto ocorra, o terapeuta também precisa utilizar de sua criatividade construindo um espaço de resgate do senso estético do cliente, onde ele possa “fazer arte” e exercer seu potencial criativo. Os experimentos, por exemplo, são uma ótima forma de se promover, no espaço terapêutico, a possibilidade de vivenciar uma realização artística espontânea.
Sendo assim, percebemos que a criatividade não é um elemento adicional; algo “extra” para o qual é necessário encontrar um tempo em nossas vidas corridas. A criatividade é, na verdade, tudo o que fazemos enquanto estamos vivendo. Portanto, é imprescindível viver o momento presente, o aqui e agora, pois só assim crescemos e amadurecemos, compreendendo e abrindo mão de seguranças ilusórias que a vida tende a nos oferecer. O ato de permitir-se viver de forma criativa e arriscar-se mais, tem a ver com a possibilidade reconstruir-se, modificar-se, de estar aberto para o mundo e de acolher as mudanças. Tendo sabedoria para não antecipar-se ao momento que está por vir, deixando sempre a porta aberta e o coração sereno, admitindo todas as possibilidades que a vida venha a nos oferecer.
Beatriz Meneses
(Artista Plástica e Psicóloga)
beatriz.cmeneses@live.com
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